quinta-feira, 8 de março de 2012

Recordações de minha mãe no Dia Internacional da Mulher

Minha mãe, minha tia e eu no dia do meu lançamento de livro no Rio
                                                      
 Hoje recordando saudosamente minha mãe toda uma vida desfilou frente aos meus olhos que extasiados observavam através da imaginação. Costumo fazer isso muitas vezes em momentos de alheamento, introspecção e privacidade. Mas dessa vez foi algo mais nítido como se tudo estivesse se passando naquele momento.

Revia-a jovem, os cabelos muito escuros e brilhantes, os olhos negros e grandes, a pele aveludada com a maciez de alguém que não abusa da maquillagem, a bela figura jovem que algumas vezes me esperava na porta de minha casa antes que eu descesse do ônibus escolar.

Não lembro exatamente de minha mãe cuidando dos pequenos detalhes de uma casa ou dos filhos no dia a dia. Eu a amava, contudo não conseguia falar de mim mesma ou do que se passava comigo em nenhum momento. Sempre foi cerimoniosa e formal em demasia.

Lembro-me dela sentada na sala, elegante e perfumada, os lábios cujo batom dava à sua pele uma cor especial e bonita, e realçava a cútis muito clara. Em nenhum momento a via ter um gesto mais descontraído como hoje estamos cansadas de abusar.

Revendo-a corri no tempo até minha infância no bairro de Copacabana no Rio de Janeiro numa rua de tanto movimento que os adultos se assustavam cada vez que chegávamos até o portão da casa. Mas foi ali na Rua  Barata Ribeiro com os carros alucinadamente correndo, muita gente passando apressada, as crianças impedidas de brincar em suas bicicletas ou patinetes, as casas ainda sem tantas grades e as lojas num movimento crescente de clientes que eu vivi minha infância e adolescência. Era ali que eu construía meus castelos de sonhos de papel que a vida nem sempre transformaria em algo sólido como pedra e muitas vezes rasgaria sem piedade. Era ali que eu aprendia a reconhecer as pessoas, a vê-las em momentos variados de alegria esfuziante, entusiasmo crescente, placidez monótona ou tristeza arrebatadora.



Era ali que eu recebia minhas amigas mais queridas, que brincava ou observava, mas sempre com alguém a me recomendar prudência e que via o mundo com olhos encantados. Era ali que no interior daquela casa num imenso terreno eu fazia minhas evoluções nos patins cujo rodopio me dava a sensação vertiginosa de vida e efervescência e cujo fascínio me arrebatava. E foi ali que eu cresci entre o movimento que aumentava cada vez mais e o progresso ainda maior que chegava antes de qualquer coisa para se instalar a um tempo magnífico e perigoso. Para mim aquele lugar era o paraíso que eu observava com olhos deslumbrados e ansiosos procurando sempre ver mais e mais profundamente.


Era ali, bem perto do mar que exercia sobre mim uma estranha magia e também conforto apesar de sua imensidão. Era na praia olhando as ondas que subiam que muitas vezes eu encontrava uma tranqüilidade estranha e podia pensar, devanear ou me acalmar.
Sentindo nos pés a água muita gelada eu entendia que a força daquele infinito era o rei do universo. E o respeitava, mas também o idolatrava.
 E o sol que esparzia seus raios sem nenhuma cerimônia e cujo calor me trazia uma sensação agradável quase sensual na tepidez com que se encostava a minha pele, me dava uma energia incomparável.

 Foram essas recordações que  me transportaram de uma maneira completamente arrebatadora fazendo com que eu me sentisse outra vez aquela garota cujo movimento e beleza desse bairro carioca em que fui criada me dominasse a ponto de me ver sentada tão perto do mar que quase sentia minha pele molhada e áspera pela areia grudada em todo meu corpo. 
Vânia Moreira Diniz
               

4 comentários:

  1. Parabéns, Vânia. Pelo Dia Internacional da Mulher. Pela MULHER que você é. Pela sua obra e trabalho e exemplo de vida. Parabéns!!. Maria Félix

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  2. Vania

    Posso dizer que me lembro bem de sua mãe, e de sua casa na Rua Barata Ribeiro.
    Era uma casa com moveis lindos, cheios de bibelôs, que me encantavam. Eu ficava admirando-os muito quando ia te visitar. Achava maravilhoso, aqueles bibelôs emcima das mesinhas. Acho que tb. tinha um piano. Estou certa?
    Lembro bem de sua mãe me recebendo e ficava encantada com toda sua familia.
    Lindas recordações eu tenho desse tempo.
    Beijos mil
    Ruth

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  3. Lindas recordações e que me tocam tanto diante da realidade poética que ela apresenta... Sempre me emociona a recordação de nossa mãe, de nossa casa, do palco de nossa infância. E neste dia especial não poderia ter tido reflexões mais belas, escritas com seu coração de poeta e filha. Parabéns, mana adorei!!! bjs Cris

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  4. "...Era ali, bem perto do mar que exercia sobre mim uma estranha magia e também conforto apesar de sua imensidão. Era na praia olhando as ondas que subiam que muitas vezes eu encontrava uma tranqüilidade estranha e podia pensar, devanear ou me acalmar...."

    Vaninha reler estas tuas palavras sobre tua mãe também fizeram-me voltar e relembrar nossa primeiras conversas, compartilhando os segredos como duas amigas de infância...
    Muito obrigada querida manamiga, Escritora que me faz tanto bem.

    "...Não lembro exatamente de minha mãe cuidando dos pequenos detalhes de uma casa ou dos filhos no dia a dia. Eu a amava, contudo não conseguia falar de mim mesma ou do que se passava comigo em nenhum momento. Sempre foi cerimoniosa e formal em demasia.

    Lembro-me dela sentada na sala, elegante e perfumada, os lábios cujo batom dava à sua pele uma cor especial e bonita, e realçava a cútis muito clara. Em nenhum momento a via ter um gesto mais descontraído como hoje estamos cansadas de abusar. ..."

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